Sugestão de música para a leitura: Racionais Mc´s – A vida é desafio. As pessoas estão muito mais apaixonadas pela estética da fala que pelo seu conteúdo. Esse auditório, que sofre com a violência urbana, não tem nenhuma visão do programa político de seu candidato. Tu amas ser enaltecido e enganado, sempre escutando os
Sugestão de música para a leitura: Racionais Mc´s – A vida é desafio.
As pessoas estão muito mais apaixonadas pela estética da fala que pelo seu conteúdo.
Esse auditório, que sofre com a violência urbana, não tem nenhuma visão do programa político de seu candidato.
Tu amas ser enaltecido e enganado, sempre escutando os faladores de boca aberta,
Disse uma vez Aristófanes. E e os gregos possuíam um verbo para designar os atenienses estúpidos reunidos para a deliberação: Chainein.
Trata-se do ouvinte passivo, aquele que adorava ser enaltecido, especialidade de Cleon, demagogo que se dedicava a elogiar as multidões.1
Os gregos entendiam o silêncio do auditório não como uma virtude, uma espécie de escuta inteligente e fecunda, mas como a rejeição impotente ou a estupidez de um público de espectadores.
Tucídides preveniu aos atenienses que não se comportassem como um público de teatro, “sentados a ouvir injúrias pessoais”, perante a eloquência política.
E nessas eleições somos vítima da estupefação do auditório com aduladores de fazendeiros, de empresários e das forças armadas.
A população se sensibiliza com a eloquência violenta, carregada de soluções prazerosas por valorizarem a tortura e que bajulam o “cidadão de bem”.
Lembra os versos de Sólon que acusavam os atenienses de serem demasiadamente sensíveis às falas vazias de Pisístrato:
Vocês são apenas olhos para a língua e para as palavras de um homem hipócrita e, para o ato que ele prepara, vocês não têm nenhuma visão.
As pessoas estão muito mais apaixonadas pela estética da fala que pelo seu conteúdo.
Esse auditório, que sofre com a violência urbana, não tem nenhuma visão do programa político de seu candidato.
Quer apenas ouvir uma retórica imponente, com gestos e mímicas em um jogo de expressões agressivas nas quais o rosto mostra-se demasiadamente severo representando a solução do problema que mais o assombra: a violência.
A violência é excitante porque desde os primórdios foi uma forma de sagrado.
Os rituais de sacrifício de sangue esteve presente nas mais variadas religiões do mundo e, segundo a bióloga Barbara Ehrenreich, estão estritamente ligados às origens da guerra.
Como dizia Bakunin:
Todas as religiões são cruéis, todas envolvem sangue, já que tudo se baseia principalmente na ideia de sacrifício.
Por isso, não devemos ficar surpresos com a adesão religiosa ao discurso político violento.
Exemplo do poder inebriante dessa eloquência que encanta pela violência contra alguma coisa pode ser visto no relato do psicólogo inglês Roger E. Money-Kyrle que participou de um comício de Hitler:
Aos poucos, as pessoas pareciam perder sua individualidade e se fundirem num monstro não muito sagaz mas imensamente poderoso, pouco racional e portanto capaz de fazer qualquer coisa.
Como no teatro grego, esse auditório adora ouvir “injúrias pessoais”.
E não se importa se o candidato irá arrancar os seus direitos, se irá continuar a política econômica do governo que tanto detesta, se promoverá o desmatamento e o uso de agrotóxicos nos alimentos, ele só quer se satisfazer com a força e a beleza das palavras.
É a “escuta-olhar” como apontou Sólon sobre Pisístrato:
Ao invés de olhar os fatos e de escutar as falas, utiliza-se os olhos para não ouvir.
Mais uma razão para a febre dos memes.
Portanto o discurso político apela um afeto social que promove uma identificação:
O cidadão, mediante um processo irracional, funda sua identidade na do político.
Explica Patrick Charaudeau.
O medo da violência leva as pessoas a agir irracionalmente.
E por seguinte a agir “por meio de imaginários que atribuem valores positivos e negativos”.
Para tal temos que ter em mente que a violência cotidiana é sempre uma forma de manter a reputação.
Os pais batem nos filhos para manterem a reputação de pais, o marido bate na mulher com o mesmo objetivo, o branco que caçoa o negro e o índio, o professor que grita com o aluno etc.
Todos querem manter a reputação.
Por isso o moralista se pauta na violência, já que a reputação nada mais é do que um elemento dos valores, dos costumes.
Portanto, a violência é usada para construir eleitores estupefatos.
Tanto a violência real a qual se demoniza alienadamente, quanto a violência da fala que provoca paixão e arrepio, silenciando todos os outros aspectos da vida pública (educação, saúde, moradia etc.).
Ela o faz regredir a Idade Média quando os vassalos faziam um acordo com os senhores feudais: Fidelidade em troca de segurança.
Torna-se homem de alguém, servo, aceitando tudo que faz em troca de proteção.
Precisamos tomar muito cuidado para não nos tornarmos estúpidos e para tal é necessário ouvir com os ouvidos, sem nos deixar inebriar pelo prazer que o espetáculo da violência promove.
Vide o sucesso dos filmes de Hollywood e os torneios de MMA.
Deixe seu comentário
Seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios estão marcados com *